ALMA LUSITANA

Ao olhar pela janela mirou a linha do horizonte e era como se estivesse a ver Portugal, esbatido, pequeno, no limiar da imaginação. Na televisão passava o noticiário português – as mesmas tretas de sempre contadas da mesma maneira. Já há algum tempo que não assistia à televisão portuguesa. Mas foi bom ouvir o sotaque, pois ele próprio começava a perder o dele. Saiam-lhe sons cantados, embalados no samba e novas expressões. Era notória a diferença aquando da sua chegada. Era difícil voltar a ouvir um brasileiro dizer, “Desculpa, não entendi”. E cada vez construía mais memórias para aumentar a sua saudade. A saudade daqueles que o acolhiam há três meses. O seu corpo, já enérgico desde a nascença, percebia agora que ainda mais energia tinha. Todo o calor e o samba despertavam nele novas vibrações. Tudo estava em constante mudança. Quem seria quando voltasse a pisar as terras distantes onde diz ter vivido?
Ao olhar a caixinha mágica, não pôde deixar de sentir a vagabunda tristeza lusitana:

“ Se queres ser o meu senhor
E teres-me sempre a teu lado
Não me fales só de amor
Fala-me também do fado
Que o fado que é meu castigo
Só nasceu p’ra me perder
O fado é tudo o que digo
Mais o que eu não sei dizer

Almas vencidas, noites perdidas, sombras bizarras
Na Mouraria canta um rufia, choram guitarras
Amor, ciúme, cinzas e lume, dor e pecado
Tudo isto existe, tudo isto é triste, tudo isto é fado”

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