O QUE ANTÓNIA NÃO QUERIA VER

Quando abriu a porta de novo, com a chave que encontrara nos pertences do seu falecido marido, não imaginou que o mundo atrás daquele pedaço de madeira fosse mudar a sua vida. Como poderia ela entender tais coisas? Que o seu marido havia sete anos que vivia uma vida dupla, uma vida da qual ela não fazia parte, uma vida onde era feliz! A dor na sua cabeça ficou mais aguda. Suportar a ideia de que o seu marido tinha uma amante era uma coisa... suportar a ideia de que o seu marido tinha um amante era outra. A expressão do amor tornava-se complicada. Ela julgava conhecer todos os cantos da cabeça do seu marido, os gostos, os desgostos, os prazeres, as paixões, as desilusões... e afinal era só metade. Metade do seu sorriso, metade do seu amor, metade do seu prazer.

Antónia acabou por se tornar uma hospede da casa do amante do seu marido. Era-lhe necessário compreender, entender, encontrar a verdade sobre a pessoa que amava há quinze anos. E foi feliz na descoberta desse outro mundo. De um outro modo de ver e olhar a vida e o amor. E quando se apercebeu estava apaixonada pelo amante do seu marido, pela única recordação que lhe restava. O desejo de sentir o que ele sentia... e então resolveu partir. Poderia ela acusar o amante de lhe ter roubado o marido? Poderia ela culpá-lo das vivencias que não teve? Poderia ela ama-lo por ter amado o seu marido incondicionalmente? Poderiam chorar juntos a morte de um amor? Sabia que um dia iria voltar. E o mundo do seu marido era agora o seu mundo. E, mesmo que ausente, a sua memória continuava presente naquele apartamento. Nas conversas, nos olhares, nos sorrisos, nas lágrimas. E dentro de si carregava uma nova vida...

1 comentário:

Unknown disse...

todo mundo tem seu momento para aprender a dividir suas pessoas com outras pessoas, já que a gente sempre divide para os outros...