COMPLEXO TYLOR DURDEN

Acordas um dias, dás por ti e não és tu que estás lá. É outra pessoa. Outra pessoa viveu a tua vida por ti. E agora? Como voltas a encarar tudo? Todos olham para ti de outra forma, ou diria mesmo, já não é para ti que olham. Sentes-te um estranho no teu próprio corpo. Tocas na tua cara e a sensação é a mesma. Então o que está diferente? Porque olham para ti assim? Tentas reagir como sempre fizeste. E todos estranham que assim o faças. Esperam de ti outra coisa. Mas que coisa? Tu não sabes, tu não viveste o que eles julgam teres vivido. Viveste outras coisas, de outro jeito, de fora, por assim dizer.

Concentras-te para perceber o que mudou. Para perceberes o que andaste a fazer este tempo todo. Vasculhas as contas telefónicas e encontras chamadas que julgas não ter feito. No estrato do cartão encontras compras daquilo que não sabes. Abres a gaveta e vês fotos tuas por lugares que não conheces. E, quando dás por ti, criaste uma sociedade secreta, um clube, um clube de combate. Desces até à cave e encontras um mundo que não sabes ter criado. Todos te admiram por aquilo que não queres ser admirado. Porque terão os outros essa visão de ti? Pensas no que poderás ter feito. E no que poderás fazer para mudar tudo. E, sem saberes bem porque, tens a sensação de que nada vai mudar. Pois nada pode ser desfeito. Pensas então no que poderás mudar daqui para a frente. Caminhas pelos lugares por onde supostamente andaste e vais compondo o puzzle. Estás quase a entender o jogo. Estás quase a perceber a razão de tudo. E quando finalmente encontras a resposta ficas pasmo contigo mesmo. Efectivamente eras tu. Efectivamente fizeste o que fizeste. Quiseste ser aquilo que sempre sonhaste. Quiseste sentir aquilo que sempre te apeteceu. Quiseste viver aquilo que a tua vida não permitia. E tudo recomeça quando voltas à estaca zero. Mas há coisas que não podes mudar. Matas-te a ti mesmo e, no fundo, só matas uma parte de ti. Dás a mão à pessoa que amas e ficam ali à espera que a destruição comece. Tudo à tua volta começa a ruir. Os prédios explodem. A cidade arde. E ali ficam vocês, de mão dada, para entrarem na tua nova vida. Uma vida que não mais será igual à anterior. Explodiste com o teu apartamento, correste o mundo, criaste um ideal de vida, um ideal de morte. E apercebes-te que nunca deixaste de ser aquilo que sempre foste: Tyler Durden.

“Warning: If you are reading this then this warning is for you. Every word you read of this useless fine print is another second off your life. Don't you have other things to do? Is your life so empty that you honestly can't think of a better way to spend these moments? Or are you so impressed with authority that you give respect and credence to all that claim it? Do you read everything you're supposed to read? Do you think every thing you're supposed to think? Buy what you're told to want? Get out of your apartment. Meet a member of the opposite sex. Stop the excessive shopping and masturbation. Quit your job. Start a fight. Prove you're alive. If you don't claim your humanity you will become a statistic. You have been warned”

Tyler Durden in Fight club

2 comentários:

Manuel disse...

Á medida que ia lendo o texto fui me recordando de um filme que já tem uns anitos e que se chama Angel Heart, com o Mickey Rourke e Robert DeNiro. É o descobrir-se, o encontrar-se noutro corpo que afinal de contas não é o dele, e um pacto que fez, mas quem lhe dera a ele não ter feito...
- o melhor memso é veres o filme
Um abraço do tamanho do Atlântico

Paulo disse...

"Ai sonhos prantos rios vosso corpo
De lírios e ortelã agreste
São sonho que morre
São água que corre
que da minha sede
Bebeste"
(Amália Rodruigues)- Fado