DUAS TATUAGENS

Não foi a primeira nem seria a última vez em que pensou no quão gostaria de ser pai. A hipótese de não o ser não o deixava tranquilo – nem quis entrar na quantidade de crianças que não eram amadas pela quantidade de pais que não as quiseram. A única pergunta que se colocava era se iria ser um bom pai. O que lhe iria dizer quando este ainda nem soubesse falar? E quando este começasse a falar do que falariam? Estaria preparado para as doenças, para as noites mal dormidas, mudanças de fraldas, o primeiro “dói-dói”, as birras, as más educações? E o que faria no dia em que ele lhe pedisse uma coisa extremamente cara? Ou muitas coisas baratas? Como reagiria ao seu primeiro dia de escola? E a atenção que lhe daria nos trabalhos de casa, no acompanhamento dos seus hobbies, dos seus desportos? Iria ele reconhecer o seu amor? Iria gostar dele, ou ele transformar-se-ia no pai tirano quando a muito custo lhe dissesse o primeiro não, lhe desse a primeira palmada? Saberia ele acompanhar o seu crescimento? Tantas eram as ideias que tinha, será que dariam certo? Será que estaria capacitado para lhe dar uma boa educação? E se as coisas não funcionassem? Se ele se revoltasse contra ele? Como se sentiria quando ele fizesse a primeira viagem sozinho... quando ele não estivesse por perto por mais de uma semana... por mais de um mês... por mais de um ano? Aguentaria não saber o que estaria ele a fazer? E quando fosse a altura de ele decidir uma área? Saberia ajudá-lo? Saberia aceitar a sua decisão? E se porventura descobrisse um maço de cigarros como reagiria? Ou droga dentro da mochila? (Não... ele não iria espreitar a sua mochila) Mas se aquilo ficasse deixado por engano à vista? E quando ele começasse a perguntar aquelas coisas mais difíceis de responder? Teria ele o à vontade para lhe explicar? Será que lhe iria contar quando tivesse uma namorada ou namorado? Ou iria esconder-lhe tudo isso? E quando tivesse relações sexuais? O que lhe diria? Dar-lhe-ia conselhos ou entraria em estado nervoso? E se um dia ele quisesse pintar o cabelo? E se a cor fosse vermelho? Roxo? Amarelo? E se ele começasse a falar na ideia de fazer um piercing? E se isso acontecesse aos 14 anos? E se não fosse só um mas vários? E se ele aparecesse já com um feito? E se ele um dia, por acaso, me mostrasse que tinha feito duas tatuagens?...

Deixou de pensar nisso, afinal, ser pai era uma coisa que tinha de esquecer. Será que a sociedade iria mudar antes de ele deixar de ter idade para ser pai? Ele só queria amar esse filho incondicionalmente, respeitá-lo, aceitá-lo como ele fosse, ajudá-lo, encaminhá-lo, ser seu amigo, ser a sua referencia e ser amado por ele. Perante tudo isto o que seriam afinal duas tatuagens?

1 comentário:

ÁguaDiCoco disse...

"Minino"...tens um dom especial...beijinhos e até já (aproveita!!)