CONVERSAS ENTRE A VIDA E A MORTE III

- Ainda não desististe?
- E tu vens sempre não vens?
- Sabes que sim... enquanto precisares de mim.
- Ai meu avô, e agora?
- Estás a perguntar-me a mim? Eu só percebo dos mortos, os vivos já são uma recordação do passado. Mas porque suspiras tanto?
- A vida também te foi difícil?
- Nem imaginas tu o quanto. Mas os tempos eram outros. Como anda a tua avó?
- Está bem. No outro dia pude vê-la a sorrir. Pareceu-me tão bem disposta. Queria tanto abraçá-la mas os computadores ainda não nos permitem fazer isso.
- Ai essas tecnologias... Mas deixa-me dizer-te uma coisa. Dificuldades terás sempre na vida. A todo o momento vais deparar-te com provas, com questões, com dilemas e para todos eles vais ter de começar por respirar fundo. Vais sentir o coração acelerar, mas não te preocupes, é normal. Depois fechas os olhos e tentas perceber o que realmente pensas, como realmente te sentes. Acima de tudo tens de ser verdadeiro contigo mesmo.
- E se eu não achar a verdade meu avô?
- Procura mais fundo, cava mais um pouco. Afinal se tu és tu hás de saber de ti. Ou não?
- Acho que sim. Mas também existe uma coisa chamada a confusão da mente.
- Relaxa. Se não te entenderes já, entender-te-ás daqui a uns tempos. Não podes ser apressado. As coisas têm o seu tempo, tens de aprender a esperar, a ouvir, a sentir.
- E se eu não tiver esse tempo?
- Se não tiveres esse tempo então é porque não era necessário descobrires essa verdade, é porque andavas a procurar a verdade errada. Mas não desanimes, vais encontrar um caminho, agora não te garanto que seja fácil percorrê-lo.

A brisa tocou-lhe a cara, sentiu o vento rodar no seu corpo e despediu-se do seu avô.

- Até mais avozinho!

2 comentários:

Graduated Fool disse...

As tuas conversas com o teu avô sempre me comoveram. Sempre achei tão bonita a vossa ligação. O sentires que ele está lá, tantas vezes ao teu lado, como um calor, uma brisa que buscas quando precisas, que te surge quando sabe que precisas.

O carinho com que sempre falaste dele, a ternura que os teus olhos deixavam transparecer. Tantas vezes que vos imaginei aos dois, tu pequenino a seu lado, a ouvi-lo, a adorá-lo. Tu já adulto, ali sentado, a falar dele com tanta admiração. Quase que o sentia ali. Tu sorrias, sentia que ele sorria e eu sorria também por isso.

Hoje deito-me com uma lágrima e um sorriso. Hoje deito-me a adorar o azul. O azul do pequenino Monstro das Bolachas.

Unknown disse...

não foi sem demasiada comoção que li este diálogo.....fez-me recordar aquele dia em que sofri profundamente pela perda de uma pessoa que amava muito....e recordo-me de ti, na varanda fazendo a tua despedida naquele momento em que nunca foi uma despedida para sempre...e não será...
amo-te muito