Fui levantar os bilhetes no dia anterior, o Chiado estava caótico. Mas o que interessava o aglomerado de pessoas quando tinha nas mãos os bilhetes para ir ver o novo musical português? Se há coisa que me consegue elevar a outro estado é um bom lugar, numa boa sala de teatro a ver um bom musical. E as cartas estavam lançadas, primeira fila no primeiro balcão, o teatro era o São Luiz, um dos quais tenho maior afinidade ao nível da sua beleza estética, só restava esperar e ver o que iria sair dali enquanto espectáculo.
O meu pai apanhou-me em casa já um pouco em cima da hora, o que só deu mesmo tempo de um pequeno lanche ajantarado na Benard, onde sou sempre bem atendido pela senhora da caixa registadora com a voz melodiosamente simpática. Mas pouco tivemos para estar ali e apreciar os pregos no pão. Faltava um quarto de hora e fomos para o teatro. Era a noite de estreia e aquilo estava pejado de figuras da televisão, do teatro e outros daqueles que simplesmente aparecem, que simplesmente estão. Entrámos e fomos logo para o lugar – odeio atrasos. Enquanto o meu pai ia falando sobre as suas vitórias na carreira pela vigésima primeira vez, os meus olhos seguiam atentamente tudo o que se passava à minha volta. Os “conhecidos” faziam de tudo para serem notados, fotografados, mas faltavam dois minutos e a sala ainda estava vazia. Onde se havia metido toda a gente? Atrás de nós um casal comentava o mesmo facto e o meu pai continuava entusiasmadíssimo a contar-me aquilo que eu já sabia. Por incrível que pareça, as últimas pessoas a chegarem foram, na sua maioria, actores – aqueles mesmo que gostam de ser respeitados quando são eles que estão no palco – ironia talvez...
As luzes apagam, o pano sobe e a banda começa a tocar – O teatro musical português começa a ganhar uma forma e uma estética específica. É fácil reparar nas semelhanças entre as produções inteiramente portuguesas. Será que podemos dizer que começa a existir um estilo próprio do musical português? Eu confesso que espero que não. Pois se isto é o musical português podem parar por aqui. Valeu o esforço... mas chega! No historial dos musicais fabricados inteiramente em português podemos contar com alguns nomes como: Lá ao Fundo o Rio, O Navio dos Rebeldes, Pedras Rolantes, Sexta-feira 13, Cabeças no ar... entre outros. Quando vi Lá ao fundo o Rio e O Navio dos Rebeldes achei que em Portugal se estava a começar a esboçar um sorriso bem largo para o teatro musical, mas tudo o resto veio detonar esse sorriso – Sem uma introdução rapsódica inicial, como mandam as regras do género musical, para que o espectador se integre no ambiente que vai ser apresentado, vemos, no escuro, a cara de um dos actores, que logo abre a goela para cantar, e a voz não era nada má, sendo as vozes a única coisa que salvou a noite. Quando as luzes acendem deparo-me com a mesma visão de sempre a que o género nos tem habituado, um fundo de tela branca ou preta, o chão de linóleo e umas estruturas a que chamam de cenários. E a esta estética nem o La Féria escapa com as suas “versões” dos musicais americanos e ingleses – que em nada têm a ver com a verdadeira grandiosidade dos originais. Mas voltando ao musical português, depois das “pequenas” falhas iniciais – talvez justificáveis pela falta de orçamento – seguimos para aquilo que, já dizia Camões, é preciso fazer com engenho e arte. E assim me refiro à pobreza das musicas, à pobreza dos conteúdos da escrita, à pobreza de qualquer emoção mais profunda, qualquer sentimento mais requintado. Passam então duas horinhas de entretenimento fácil, que nos faz sair dali tal como entrámos. Quando me perguntam se o espectáculo foi bom, respondo: “Eles cantavam bem”.
Nunca esperei ver em Portugal um sucesso que durasse 22 anos, como acontece no West End como meu musical de eleição, Os Miseráveis, até porque a nossa realidade é outra, a escala é outra e o mediatismo dentro do género é outro. Mas se queremos actuar dentro do género há que olhar para os melhores e perceber o que eles fazem para fazer bem. E não é preciso ir muito longe, basta comprar uma passagem na easy jet de 50 euros ida e volta, um hotel barato nos arredores a 10 euros a noite e comprar um bilhete de 25 euros na última fila e decerto será tudo dinheiro muito bem gasto, mesmo que sendo na última fila. E aí poderemos perceber o que é um bom texto, o que é uma boa divisão de espectáculo, com momentos calmos, momentos tristes, momentos intensos, momentos de magia, momentos de alegria, o que é ter vontade de subir para o palco e viver com eles, o que são boas canções que nos tocam, que nos fazem rir, chorar, vibrar, encantar, e quando o pano sobe deparamo-nos com visões montadas com o mais fantástico pormenor, a mais deliciosa poesia, a mais escandalosa solução, onde do primeiro ao último minuto sustemos a respiração, onde temos tempo para sonhar, para amar, para nos sentirmos vivos, onde no final não queremos abandonar a sala, não queremos esquecer aquela aura, aquela vibração, onde sentimos as pessoas numa vibração estonteante de conjunto, onde os sorrisos se abrem a mil, as almas ficam relaxadas, o corpo voa, na cabeça trauteiam-se as canções, e isto sim... é espectáculo! E sempre que saí de uma dessas salas de espectáculos perguntei-me: “Onde estavam as falhas?” mas logo apercebi-me que nem tive tempo de me sentir aborrecido para sequer pensar nelas.
*
É fácil criticar... eu sei...
O meu pai apanhou-me em casa já um pouco em cima da hora, o que só deu mesmo tempo de um pequeno lanche ajantarado na Benard, onde sou sempre bem atendido pela senhora da caixa registadora com a voz melodiosamente simpática. Mas pouco tivemos para estar ali e apreciar os pregos no pão. Faltava um quarto de hora e fomos para o teatro. Era a noite de estreia e aquilo estava pejado de figuras da televisão, do teatro e outros daqueles que simplesmente aparecem, que simplesmente estão. Entrámos e fomos logo para o lugar – odeio atrasos. Enquanto o meu pai ia falando sobre as suas vitórias na carreira pela vigésima primeira vez, os meus olhos seguiam atentamente tudo o que se passava à minha volta. Os “conhecidos” faziam de tudo para serem notados, fotografados, mas faltavam dois minutos e a sala ainda estava vazia. Onde se havia metido toda a gente? Atrás de nós um casal comentava o mesmo facto e o meu pai continuava entusiasmadíssimo a contar-me aquilo que eu já sabia. Por incrível que pareça, as últimas pessoas a chegarem foram, na sua maioria, actores – aqueles mesmo que gostam de ser respeitados quando são eles que estão no palco – ironia talvez...
As luzes apagam, o pano sobe e a banda começa a tocar – O teatro musical português começa a ganhar uma forma e uma estética específica. É fácil reparar nas semelhanças entre as produções inteiramente portuguesas. Será que podemos dizer que começa a existir um estilo próprio do musical português? Eu confesso que espero que não. Pois se isto é o musical português podem parar por aqui. Valeu o esforço... mas chega! No historial dos musicais fabricados inteiramente em português podemos contar com alguns nomes como: Lá ao Fundo o Rio, O Navio dos Rebeldes, Pedras Rolantes, Sexta-feira 13, Cabeças no ar... entre outros. Quando vi Lá ao fundo o Rio e O Navio dos Rebeldes achei que em Portugal se estava a começar a esboçar um sorriso bem largo para o teatro musical, mas tudo o resto veio detonar esse sorriso – Sem uma introdução rapsódica inicial, como mandam as regras do género musical, para que o espectador se integre no ambiente que vai ser apresentado, vemos, no escuro, a cara de um dos actores, que logo abre a goela para cantar, e a voz não era nada má, sendo as vozes a única coisa que salvou a noite. Quando as luzes acendem deparo-me com a mesma visão de sempre a que o género nos tem habituado, um fundo de tela branca ou preta, o chão de linóleo e umas estruturas a que chamam de cenários. E a esta estética nem o La Féria escapa com as suas “versões” dos musicais americanos e ingleses – que em nada têm a ver com a verdadeira grandiosidade dos originais. Mas voltando ao musical português, depois das “pequenas” falhas iniciais – talvez justificáveis pela falta de orçamento – seguimos para aquilo que, já dizia Camões, é preciso fazer com engenho e arte. E assim me refiro à pobreza das musicas, à pobreza dos conteúdos da escrita, à pobreza de qualquer emoção mais profunda, qualquer sentimento mais requintado. Passam então duas horinhas de entretenimento fácil, que nos faz sair dali tal como entrámos. Quando me perguntam se o espectáculo foi bom, respondo: “Eles cantavam bem”.
Nunca esperei ver em Portugal um sucesso que durasse 22 anos, como acontece no West End como meu musical de eleição, Os Miseráveis, até porque a nossa realidade é outra, a escala é outra e o mediatismo dentro do género é outro. Mas se queremos actuar dentro do género há que olhar para os melhores e perceber o que eles fazem para fazer bem. E não é preciso ir muito longe, basta comprar uma passagem na easy jet de 50 euros ida e volta, um hotel barato nos arredores a 10 euros a noite e comprar um bilhete de 25 euros na última fila e decerto será tudo dinheiro muito bem gasto, mesmo que sendo na última fila. E aí poderemos perceber o que é um bom texto, o que é uma boa divisão de espectáculo, com momentos calmos, momentos tristes, momentos intensos, momentos de magia, momentos de alegria, o que é ter vontade de subir para o palco e viver com eles, o que são boas canções que nos tocam, que nos fazem rir, chorar, vibrar, encantar, e quando o pano sobe deparamo-nos com visões montadas com o mais fantástico pormenor, a mais deliciosa poesia, a mais escandalosa solução, onde do primeiro ao último minuto sustemos a respiração, onde temos tempo para sonhar, para amar, para nos sentirmos vivos, onde no final não queremos abandonar a sala, não queremos esquecer aquela aura, aquela vibração, onde sentimos as pessoas numa vibração estonteante de conjunto, onde os sorrisos se abrem a mil, as almas ficam relaxadas, o corpo voa, na cabeça trauteiam-se as canções, e isto sim... é espectáculo! E sempre que saí de uma dessas salas de espectáculos perguntei-me: “Onde estavam as falhas?” mas logo apercebi-me que nem tive tempo de me sentir aborrecido para sequer pensar nelas.
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É fácil criticar... eu sei...
4 comentários:
Que cultural que tás...
Eu adoraria ter ido ver os sketches dos Monty Pithon, no casino, mas não tive time!
Não me parece que o Pedro esteja a referir-se a algo como os sketches dos Monty Pithon.
Os Monty Python vou ver lá para meados de outubro, mas o músical a que me refiro é o "Cabeças no ar" que está no São Luiz.
P.S.: Eu sou muito cultural... he he he
sabes que os musicais não são meu "género" favorito..ainda assim é muito bom ler-te!
beijinhos
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