O MEDO

O que lhe metia mais medo? A velhice. Parecia-lhe tudo tão longínquo de ser um momento tão perto e no entanto estava à sua volta... por todo o lado. Olhou para as suas mãos e estas já não eram as mesmas de ontem. As linhas haviam-se condensado num conjunto de linhas riscadas, numa folha branca, depois de um acesso de raiva. Eram traços marcados, magoados, profundos. Eram os traços da sua vida. E nas suas mãos estavam contidas todas as estrelas do universo. Olhou calmamente para elas e sorriu, Então é esta a minha vida?, disse em voz baixa. Estava grato pelo que tinha. Umas mãos com uma história para contar a quem quisesse ouvir. Mas temia que essa história se alongasse para lá da sua lucidez. Temia ter assistir à sua queda. E quanto mais o tempo passava, mais se apercebia ser esse o seu destino. Olhar-se diariamente ao espelho a ver-se envelhecer. E num momento de fúria partiu os espelhos de sua casa.

Sentou-se à mesa, na sala preta, e chorou. E das lágrimas sabia não ter medo. Eram a sua forma de libertar os monstros que escondia na alma. Gotejando, uma a uma, desprendiam-se do olho e escorriam pela sua face rosada, pelo desconforto que sentiu. De cabeça baixa e cigarro aceso deixou-se ali ficar por mais um tempo. Só iria fumar mais um cigarro, e depois só mais um e mais um até que adormeceu envolto em pensamentos. Tantos quanto a sua cabeça conseguiu suportar. Na manhã seguinte o mundo já não era o mesmo! Os medos eram outros.

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