A VIDA GRAVADA NAS ESTRELAS

A cada dia que passava sentia estar mais perto o momento da sua partida. O seu corpo tornava-se a pouco e pouco invisível; como que uma tele-transportação gradual das suas partículas, um corpo a tornar-se ausente, para se tornar presente num outro espaço. Nos olhos dos outros sentia-lhes o esquivo, a perda de interesse no seu corpo transparente, a deliberada ausência de emoções, a claridade de um desejo intenso de não o ver desaparecer. Esta era uma caminhada solitária. Um confronto de sentimentos que só ele poderia resolver. E as imagem da cidade foram-se apagando, lentamente, ficando os lugares presos em memórias escuras, frias e longínquas. E a cidade da luz ganhara um breu vista dos seus olhos.

Foi-se recordando das pessoas que haviam cruzado a sua vida. Perdeu-se em memórias de tempos ocultos e deixou-se a completar o puzzle que em tempos fora a sua vida. E as recordações souberam-lhe a pouco. Queria sempre recordar-se de mais e mais. Ou mesmo queria ter outras coisas para recordar. Se à sua vida já estava agregado um passado megalómano, fazia-lhe confusão pensar em tudo aquilo que teria para recordar dali a dez ou vinte anos. E tantas foram as pessoas e as histórias que invadiram a sua vida. E o que seria dessas pessoas? Onde estariam? Que estariam a fazer?

Foi interrompido nos seus pensamentos.

- Olha para as estrelas. Ali encontrarás o teu percurso.
- Mas eu pensei que tu fosses do outro mundo.
- As pessoas julgam-se a viver em mundo diferentes umas das outras. Em parte é verdade!.. Mas isso tudo numa base muito filosófica. É tudo uma questão mental e talvez o problema esteja na nossa cabeça. Nós é que não permitimos que os mundo se juntem. Ou porque achamos que não vai dar certo. Ou porque queremos aquele mundo só para nós. Ou mesmo porque nem acreditamos que muitas vezes estejamos num outro mundo, a passear na praia e a acender estrelas.
- E a estrela que me deste?
- Tens duas hipóteses. Ou guardas a estrela junto ao teu peito ou a colocas no céu como algo que fez parte do teu curso.

E quando deu por si estava sozinho outra vez. Olhou para a estrela, pousada na sua mão, e admirou a sua luz. E com um sorriso, olhando para as outras estrelas no céu, guardou aquela bem junto do seu peito.

Sem comentários: